segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

sentir o que não se vive

Há momentos que por serem tão determinantes no curso da História nos fazem reter onde estávamos, o que estávamos a fazer, no que estávamos a pensar. Todos sabemos onde estávamos no 11 de Setembro de 2001 (para usar um acontecimento que marcou a minha geração) e partilhar essas vivências faz-nos, por um lado, reviver o momento e avaliar se a nossa reação em tempo real fez (aos nossos olhos) jus à magnitude do acontecimento e, por outro, reconhecer semelhanças ou diferenças na reação da pessoa com quem agora partilhamos o momento. É um exercício de partilha de sensações que acaba por ser recompensador porque encontramos nas sensações dos outros sensações nossas que porventura tínhamos esquecido ou, até, formas diferentes de olhar o momento em causa.

Isto vale, naturalmente, para acontecimentos que tenhamos vivido. Tendo eu nascido na década de 80, é-me impossível lembrar onde estava no 25 de Abril de 1974, simplesmente porque não estava em lado nenhum, a não ser talvez na cabeça dos meus pais. Não podemos sentir aquilo que não vivemos. O que podemos é viver aquilo que os outros sentem.

Vem isto a propósito de um esforço que a American Archive of Public Broadcasting está a fazer de digitalizar mais de 40 mil horas de registos de áudio e vídeo de emissões das estações de rádio e tv norte-americanas da segunda metade do século XX. A revista Atlantic chamou a atenção para o assunto e está a reproduzir excertos dessas emissões que vão sendo digitalizadas. O resultado, a avaliar pelas primeiras amostras, promete ser fascinante. Senão vejamos oiçamos:



Este quarto de hora, vindo diretamente do passado para os nossos ouvidos, consegue a extraordinária proeza de nos fazer sentir de luto com a morte de alguém que nunca vimos. O mundo em que as pessoas que estão a assistir ao concerto em Boston vivem corre à velocidade normal. Neste mundo não há tempo real nem há a ditadura da informação e da partilha que as redes sociais vieram trazer. Neste mundo a notícia dada apanhou todos de surpresa e a reação de choque é tão genuína como será com certeza o silêncio e o respeito pela marcha fúnebre que se seguiu ao anúncio. Neste mundo não havia gente a dedilhar os telemóveis furiosamente para informar os informados.

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Spoiler alert: Naomi Watts NÃO mostra as mamas

Xando, é com pesar que escrevo estas linhas. Ontem comecei a ver um filme e lembrei-me disto. Durante todo o filme aguardei ansiosamente primeiro, desesperadamente depois. E é com a voz embargada, própria de quem vê o final abrupto de uma sequência histórica que tinha tudo para figurar no Guiness, que te digo que ontem vi um filme em que a Naomi Watts não mostra as mamas. Se eu soubesse não tinha visto. Juro. Mas isto foi uma decisão unilateral da minha patroa que, por ontem celebrar o seu aniversário, escolheu o filme que íamos ver. Ela escolheu, eu vomitei um pouco dentro da boca, e disse para mim: "bem, merda de filme, mas ao menos, tendo em conta a rameira que ela vai representar, vou poder dizer ao Xando que vi mais um filme com as mamas da Naomi". Mas não. Ameaçou algumas vezes mas, fosse um fato de banho que tinha de cumprir o protocolo, fosse uma camisa de homem de um paquistanês manhoso, tudo serviu para impedir que as meninas espreitassem cá para fora. Não se faz. Elas não merecem depois do que já fizeram pela Naomi.

Desculpa Xando. Mesmo.

O filme (o poster ilustra bem o colete de forças em que elas estiveram amarradas o tempo todo. Não se faz).

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

pós-Michael Sam

É um tema que está cada vez mais na ordem (desportiva) do dia: a homossexualidade e o desporto profissional. Até hoje a ideia que reina é a de que são dois mundos incompatíveis. Não porque haja incompatibilidades de facto mas porque, simplesmente, não havia até há pouco tempo registo de um atleta de um desporto profissional relevante que fosse assumidamente gay. Ninguém no seu perfeito juízo pode defender que não há gays a praticar desporto profissional ao mais alto nível, mas o facto de não haver casos que comprovem essa inevitabilidade ajuda a desconstruir a ideia de que vivemos já num mundo completamente tolerante com a homossexualidade. 

No mundo do desporto as coisas não são bem assim. O desporto caracteriza-se na maioria dos casos pela virilidade e pela agressividade e acaba por ser compreensível que os próprios gays encarem a homossexualidade como mais um obstáculo que teriam que ultrapassar caso se assumissem. É um entendimento que se baseia em pressupostos rudimentares, de acordo, mas não deixa de ser compreensível. Ninguém precisa de mais essa barreira para ultrapassar no caminho para se ser um atleta bem sucedido.

No último ano surgiram casos que pretendem ultrapassar esta barreira e fazer com que o desporto acompanhe o resto do mundo no caminho para a tolerância, primeiro, a aceitação, depois, e a indiferença, por fim. Quando for indiferente se determinado atleta é gay ou não, então aí estaremos na etapa final do caminho que os gays ainda têm de percorrer. 

Há cerca de um ano, Jason Collins saiu do armário. O assunto foi tratado com as honras que o facto de ser o primeiro atleta em atividade (há vários casos de ex-atletas que se assumem depois da carreira acabar) merecia e teve eco em todo o mundo. Mas o que o caso de Jason Collins não trouxe foi um efetivo teste à mentalidade dos agentes desportivos, sejam eles jogadores, treinadores, scouts, ou outros. Jason Collins nunca foi um jogador preponderante na NBA e, quando se assumiu, fê-lo já no ocaso da carreira impedindo que se pudesse aferir se houve ou não aceitação.

Esta semana foi Michael Sam a sair do armário e a rebentar com a porta atrás dele.  Michael Sam arrisca-se a ser "O" nilas que vai tirar tudo a limpo. Por várias razões: a) porque é bom; b) porque está a entrar no prime da sua carreira; c) porque joga o mais popular desporto dos EUA; d) porque dentro de umas semanas integrará o Draft de 2014 da NFL. Será o evento por excelência para saber se o desporto profissional (no caso, o futebol americano) está preparado para se assumir como "gay friendly". É aí que os clubes avaliam todas as características de um jogador e o escolhem ou não. Antes de se assumir Sam era apontado como um jogador muito promissor que iria com certeza figurar nas primeiras rondas do draft. Uma vez assumido, vai ser interessante ver se, quando e por quem é escolhido. 

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

o inconseguimento de não me encanitar

Pensei muito sobre o que vou dizer a seguir. Não se trata de uma afirmação dita de forma precipitada ou sem uma medição exata das consequências que a mesma inevitavelmente trará. Não me lembrei disto hoje. Não me lembrei disto ontem. Durantes os últimos meses por mais de uma dezena de ocasiões dei por mim a tentar contestar o que vou dizer a seguir. "Não. Não pode ser possível... Tem de haver alguém...", suplicava eu sempre que dava por mim a pensar aquilo que vou dizer a seguir. Mas não. É mesmo verdade. O que vou dizer a seguir é, de facto e de direito, o que eu sinto.

A Assunção Esteves é a pessoa que mais me irrita encanita à face da terra.

Sim. É verdade. I said it. Na verdade nem se trata de irritação. A irritação pressupõe que a causa é algo com importância. Um gajo irrita-se quando está a trabalhar num documento de word durante umas horas e, sem querer, apaga-o. Aí há irritação. O documento era importante e agora vou ter que o fazer todo outra vez. No caso da Esteves trata-se de "encanitação". A Assunção Esteves encanita-me.
O encanitanço, parecendo que não, é mais irritante (ou encanitante) que a irritação. Primeiro porque o encanitanço é, desde logo, mais prolongado no tempo. A irritação é súbita e poderosa, mas sempre temporária. O encanitanço não. O encanitanço ataca-nos quando menos esperamos e os seus efeitos são duradouros, além de repetíveis ao longo do tempo. Depois, o encanitanço é causado por coisas aparantemente inofensivas, o que só encanita mais, porque um gajo dá por si sem ar com merdas ridículas. E nada é mais ridículo do que a imperiosa necessidade que Assunção sente sempre que abre a boca de recorrer a vocabulário elaborado/inexistente.
Estou em cima disto desde que a senhora foi eleita Presidente da Assembleia da República. No discurso inaugural debitou sílabas que nunca se tinham encontrado na vida. Nesse dia o sangue subiu-me à cabeça instantaneamente e desde então que sempre que me vejo obrigado a ouvi-la suo das mãos. É uma chatice que, por si só, já me encanita

Inconsigo deixar de me encanitar.